quinta-feira, 29 de maio de 2014

José Profírio e as reminiscências de Trasíbulo, Pedro Fogoso e outros “doidos”

José Profírio. Foto: Luciano Lugori
Minha curiosidade pelos causos de Trasíbulo foi atiçada por Dona Valdelina, atual Secretária de Educação de Curaçá, que durante uma reunião na Biblioteca comentou sobre os “doidos” do tempo de sua infância. Desde então, tenho procurado aos mais velhos por essas lembranças, no intuito de recuperá-las e registrá-las num livro, o qual será o produto final do meu TCC.

Hoje, logo cedo, tive uma boa prosa com Seu Zé Profírio. Ele, que é natural de Macururé, chegou a Curaçá para trabalhar na construção do Cais, do Hospital Regional e do Mercado Municipal, nos final dos anos 40. A intenção da minha conversa era buscar mais informações sobre Seu Trasíbulo, que é parte integrante da pesquisa sobre os ditos “doidos” de Curaçá, e Seu Zé, numa conversa que durou aproximadamente 28 minutos, me revelou algumas histórias que ouviu e viveu nos últimos 65 anos. E lembrou:

- Trasíbulo vivia amarrado no tronco duma árvore. Sempre o via na Macambira. Ele sofria das faculdades.

Essas “faculdades” se referem, noutras palavras, à loucura (naquele tempo as ditas “doenças da cabeça”). Já ouvi dizer que Trasíbulo subia nas casas do povo, mas Seu Zé, em nenhum momento, afirmou se lembrar disso, no entanto, tem uma vaga lembrança de que essa característica parecia ser de Colotaro, outro “doido” contemporâneo. E continuou, instigado pelas minhas perguntas sobre “loucos”, lembrando a sua chegada à cidade, quando ainda era um jovem de 22 anos. Daí surgiu outro nome, o de Pedro Fogoso. 

- Quando eu cheguei aqui, Curaçá era tão bem pequena, que Pedro Fogoso, além de cuidar da cidade também zelava do cemitério, limpava e sepultava os defuntos.

Pedro Fogoso era negro, funcionário da Prefeitura e o responsável pela limpeza das ruas – serviço realizado com um carrinho de madeira e uma vassoura. Em meio à conversa, surgiu outra recordação:

- O povo da época o aperreava por causa da sua aparência e do seu sistema de vida. O apelidaram de “Urubu da Prefeitura”. Arreliaram tanto que ele morreu no mato, fugindo da “molhação da rua”.

Seu José Profírio disse que Pedro Fogoso não gostava das brincadeiras dos "entrudos" – como eram chamados os carnavais de antigamente – que eram realizadas pelos adultos. E pra escapar da agitação da rua, fugiu para o mato, onde se perdeu e morreu. 

A história mais interessante de Pedro Fogoso é a do “pé de pimenteira”:

- Nasceu uma pimenteira em cima de uma cova. Pedro, todo zeloso, arrancou os matos aos arredores e tratou de cuidar do pé de pimenta. Depois de um tempo, já carregado e com as pimentas maduras, ele as colhia e oferecia a Martinha Badeca, que inocente fazia bom uso da especiaria na sua culinária. Num certo dia Dona Martinha, sem saber a origem do tempero, e sempre grata, solicitou a Pedro mais algumas unidades. No entanto, devido o sol escaldante do verão, a pimenteira morreu. Pedro Fogoso então revelou que o tal pé da pimenta ficava no cemitério e que o mesmo havia morrido devido às secas. Dona Martinha, finalmente descobriu donde Pedro arrumava tanta pimenta.

Seu Zé, que era pra se chamar José Fernando – nome tirado de um almanaque – foi batizado como José Pereira da Silva, mas ficou conhecido como José Profírio, nome herdado do pai Profírio Pereira. Hoje, com 87 anos, completados no último dia 13 maio, mora numa residência próxima ao Teatro Raul Coelho e gasta boa parte do tempo proseando e jogando baralho com Seu Maroto, quase "noventão", e Seu Luizinho Lopes, quase "centenário".

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